Direção: Phyllida Lloyd
Elenco: Meryl Streep, Jim Broadbent, Olivia Colman
Há
uma necessidade de um carinho especial para com o personagem ao realizar um
filme biográfico. O diretor/roteirista cai no risco de esquecer de que está se
tratando de uma figura que existiu, que importou para o mundo, que fez grandes
coisas fora do universo fictício do filme. Em suma, um filme biográfico deve
sempre ressaltar o que aquele personagem foi realmente, e para isso, precisa de
tempo, precisa de referência e conhecimento, precisa de exposição dos fatos (da
maneira artística que for de escolha do diretor) e, acima de tudo, precisa de
alguém para se mascarar daquela persona
com perfeição. Afinal, a grande maioria dos atores que já interpretaram uma
figura real passou meses e meses se preparando para o papel, estudando
minuciosamente as características da pessoa, seus trejeitos, suas motivações,
sua sociabilidade, etc. Se não estiver definido na linguagem do filme de que
aquilo é uma distorção, uma caricatura ou um desvirtuamento dos fatos reais,
existe um compromisso com a verdade e com a história. E The Iron Lady conseguiu alcançar parte desses “requisitos” de um
retrato.
O
filme possui um único grande trunfo, apenas um elemento que o impede de ser
esquecido daqui alguns anos; a presença de Meryl Streep, interpretando com
força de espírito a Primeira-Ministra da Inglaterra Margaret Thatcher,
conhecida como A Dama de Ferro por seu governo marcante e de longa duração.
Streep faz parte de uma geração de atrizes que tinham uma característica em
comum: a atuação num nível acima de força no movimento, de dicção brusca e de
dramaticidade repentina e marcante. Encarnando Margaret Thatcher, ela expressa
na rigidez do corpo e das expressões faciais nada além de poder absoluto.
Domínio, controle sobre tudo aquilo, uma mulher que se tornou uma das figuras
femininas mais significativas da história. Sua atuação recebeu críticas
negativas dos familiares de Thatcher, que a chamaram de fantasiosa, o que se
encaixa perfeitamente na ressalva de que o filme talvez tenha se esquecido de
que se tratava de uma coisa real. Caricaturando ou não, foi sem dúvidas um
trabalho metódico e poderoso, principalmente na fase senil da ministra, onde
não conseguia aceitar o fato de que seu governo acabou e que seu marido
faleceu, chegando a alucinar com a presença dele. Apesar da recepção negativa
de quem realmente conheceu e conviveu com Thatcher, muitos críticos afirmam que
a atriz foi o ponto positivo do filme.
Ironicamente,
talvez a grande performance vencedora do Globo de Ouro (e provavelmente do
Oscar) foi o que atrapalhou o andamento do enredo. A impressão que fica é a de
que conseguiram Streep - em minha opinião, a melhor atriz que existe – para
interpretar Thatcher, e fizeram o filme ao redor disso, processo que, se feito
com o mesmo empenho no sentido inverso, talvez teria obtido um resultado muito
melhor. Margaret Thatcher foi responsável por algumas das maiores mudanças na
estrutura governamental da Inglaterra, realizando seus feitos num governo que
durou 11 anos; retomou as Ilhas Falkland da Argentina, fechou minas de baixo
desempenho, causando uma greve violenta entre os mineiros, instalou impostos
nos anos 80 gerando um “boom” econômico no país, tudo isso apertado num filme de
1h40 de duração, retratado juntamente com a vida pessoal da ministra em três períodos
diferentes; sua decisão de fazer alguma coisa útil e importante aos 20 anos,
quando ingressa na faculdade e conhece seu futuro marido; sua campanha e
eleição para Primeira-Ministra e seu tempo em posse do cargo; e por fim, sua
aposentadoria e saúde mental afetada. Pouco tempo para muita coisa. Tentam
compensar isso com a atuação e uma estética diferenciada. Tudo muito belo
plasticamente, mas pecando fortemente no conteúdo. Se o argumento do filme
fosse representar tudo isso sucintamente pelo foco principal na imagem, então
estaria tudo certo. Mas mesmo que quisessem representar Thatcher como A MULHER,
não A MINISTRA, faltou o elemento da identificação, da construção como personagem,
da motivação, etc.
A
diretora Phyllida Lloyd já conhece Meryl Streep de outras águas; ambas
trabalharam juntas no musical Mamma Mia!.
Enquanto no musical o trabalho com as cores é intenso, quase explosivo, para
combinar com os personagens, músicas e cenários, tudo em The Iron Lady é pastel e
fraco, remetendo à classe social, à seriedade de um governo em colapso e, ao
mesmo tempo, à elegância de uma personagem subindo mais e mais no status em sua
busca por fazer a diferença no mundo. Unido a um trabalho competente de
angulações e enquadramentos, forma uma direção com objetivo extremo na
estética. Mais uma vez, comprovando que o foco do filme passou longe da
biografia de realizações da ministra. O roteiro, como já pontuado antes, é
compactado à duração curta do filme, mas repleto de diálogos fortes e
memoráveis (os principais já entregues no trailer do filme). Fotografia,
montagem e direção de arte são também grandes contribuintes para a elegância
que o filme emite, o figurino clássico, o cabelo emanando poder, as jóias
sempre presentes...
The Iron Lady foi um trabalho agradável para todos aqueles
que pré-determinaram o que queriam ver no filme e qual mensagem queriam tirar
dele. Tivessem trabalhado com mais determinação nos feitios da grande Margaret
Thatcher, acabaríamos com um filme que faria jus à mulher titular: poderoso,
cheio de personalidade e inspirador.
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